Trabalha todos os dias, de segunda a sexta, e sente o peso do sistema que massacra o homem moderno obrigando-o a viver alienado numa sociedade que só valoriza quem é uma perfeita engrenagem. Ser bom não é bom o suficiente, pensa de si para si. Depois do almoço com duração de duas horas lê os títulos das matérias dos grandes portais de notícias e fica ainda mais revoltado com esse mundo que tanto o explora.
Uma vez leu O Banqueiro Anarquista até o fim. Adorou tudo e ficou imaginando o dia em que poderia ser livre daquela forma. Escapou-lhe a ironia. Ela é fundamental, mas nem todos os cérebros produzem a substância capaz de torná-la visível. A medicina ainda não achou a cura.
Bruno possui três pretendentes.
A pretendente número 1 se chama Cris. Cris é fã de cinema. Adora falar sobre os filmes de Martin Scorsese. Não concorda com a crítica feminista sobre a falta de representatividade nas obras do diretor. Acredita que a presença constante de mulheres não é necessária para que algo seja bom. Orgulha-se de ter mais amigos do que amigas. Já assistiu Armageddon 64 vezes. Conheceu Bruno em um evento da faculdade que discutia a questão das cotas raciais. Ela é contra. Ele é a favor. Ficaram felizes em discordarem civilizadamente. Alegravam-se com a novidade das ideias sem perceber que usavam os mesmos argumentos buscando resultados diversos. Amavam o espelho que proporcionavam um ao outro, enlevados com a autoimagem, a qual não percebiam refletida.
A pretendente número 3 se chama Jeniffer. Jeniffer é uma libriana de bem com a vida e como tal ama a beleza. É por isso mesmo que passa a maior parte de seu tempo livre tirando selfies. Seu quarto é predominantemente rosa. Jeniffer é uma garota bastante sociável, tem 819 amigos no facebook, muitos dos quais nunca conheceu pessoalmente. Gosta de observar com calma os amigos de seus amigos. Escolhe os mais bonitos, aqueles cujo tom de pele combinam com o seu e, é claro, com a cor rosa. Bruno, na visão da garota, é um amigo de amigos dos mais bonitos.
A pretendente número 2 se chama Luana. Luana e Bruno são vizinhos. Luana ficou espantada quando ele puxou assunto falando do livro em suas mãos. Marguerite Duras não é uma escritora conhecida. Passam bastante tempo falando sobre feminismo. Quer dizer, Luana passa bastante tempo falando sobre feminismo. Bruno passa bastante tempo ouvindo com atenção para poder repetir tudo e demonstrar seu conhecimento e valores libertários para as pretendentes número 1 e 3.
E Bruno é feminista. Na rua, para mulheres só olha se for com discrição. Prefere os seios empinados. E grandes, se possível. Gosta muito deles. Já foi convidado, incitado até, a ir a um American Bar resolver a questão da virgindade. Nunca foi. Não, não era vergonha. Apenas acreditava ser a prostituição fruto do machismo, foi o que disse. Orgulha-se de ter várias amigas fáceis, chega até a incentivar a facilidade nelas, mas apaixonou-se por uma menina tímida e ingênua. Não é preconceito, é que o amor não tem explicação, é mágico, ele sabe bem. Prova disso é que sua amada tem seios pequenos. De fato, não há explicação.
Bruno sente as faces rubras ao pensar nas três mulheres. A quarta está muito acima de questões terrenas, Bruno não ousa coloca-la no mesmo patamar que as outras, ele a ama apaixonadamente.
Pelo facebook, conversa calorosamente com cada um delas, de preferência ao mesmo tempo, isso sempre o faz sorrir. Quando a interação se intensifica, Bruno programa um desaparecimento. Gostaria de manter conversas com as três sempre que tivesse vontade, mas não pode, elas sempre passam a querer mais. Bruno entende de forma profunda a injustiça do mundo. Condói-se por suas mulheres não serem capazes de amá-lo com desinteresse. O egoísmo do mundo o perturba. Quer ser amado de maneira livre e sem cobranças. Porque suas três mulheres não podem fazer isso por ele? A injustiça é pungente.
Sempre preocupado com grandes dilemas da humanidade, Bruno decidiu aceitar o convite de um amigo para comparecer a uma festa em sua república. Elevado que só, sabia quando precisava relaxar para voltar com grande potência àquilo que realmente importava. Foi. Bebeu. Ficou desenvolto. Até que viu Cris. Das três pretendentes, Cris era a mais feia e também a mais atirada. Bruno a abraçou, aceitou seus carinhos. Quando ela se aproximou para beijá-lo, ele fugiu. Desviou o rosto uma, duas, três vezes. Com os olhos arregalados, notou olhares em sua direção. Notou sussurros. Notou sorrisos. Até dedos apontados notou.
Enquanto caminhava pela rua, fugindo da humilhação que o perseguia, ligou para o pai, que o buscou prontamente. Chegaram a tempo de assistir Zorra Total, comendo macarrão com salsicha. Bruno, cansado das agruras da vida, adormeceu antes do programa terminar, enternecido com os cafunés entusiasmados da mamãe.
esse bruno vive de ilusão tipo porteiro de bordel
ResponderExcluira vida não dá nem pra viver de fantasia
!!!