domingo, 24 de maio de 2015

Aqueles fios dourados





Marcos os olhava incompreendido. Eram longos e lisos. Lindos, com movimentos mais naturais que uma propaganda de xampu. A cabeça de onde nasciam era igualmente bela. Priscila possuía no nome o P da perfeição. Ela era jovem e bonita, não precisava esconder o rosto atrás de maquiagem. Usava roupas simples que evidenciavam as curvas de seu corpo. 

Marcos a olhava embevecido. Nunca se cansava. Ela era graciosa e sorridente na medida adequada. Quieta e distraída, uma boneca. Priscila era olhada por todos aonde quer que fosse. Eram os fios dourados que deixavam sua marca. Sua presença era muito mais imponente que sua dona. Mas não para Marcos. De vida simples, nunca imaginara que seu ideal de mulher pudesse existir nesse mundo. Ele a amava. 

domingo, 10 de maio de 2015

O bastão de mercúrio




Dr. Paulo era médico e às sextas-feiras fazia plantão de madrugada no pronto-socorro de um convênio cuja qualidade era mais ou menos razoável. Costumava ser tranquilo e ele passava boa parte das doze horas comendo, dormindo e tentando seduzir a enfermeira. A auxiliar, a recepcionista, a faxineira. Às vezes aparecia uma paciente da qual ele poderia se gabar. Às vezes aparecia uma paciente que ele gostaria de possuir, mas nunca admitiria. De modo geral, só via velhas cheias de varizes, grávidas neuróticas, homens com gases e bêbados. Praticar a medicina não era tão glamouroso quanto parecia à primeira vista, pensou coçando a grande barriga. O título sim, esse era motivo de orgulho, usava-o sempre que podia, dentro e fora do hospital. A não ser quando havia alguém por perto precisando de atendimento, nessas ocasiões mantinha-se em silêncio, porque precisava proteger sua vida pessoal ou não sobreviveria. 

O pior de fazer esse turno era atender os jovens com toda a sua juventude. Chegavam bêbados, arrogantes, com seus abdomens definidos e sua falta de tato, falando alto, fazendo barulho, constrangendo as mocinhas, as bonitas e empinadas pelo menos. Todos virgens, Dr. Paulo tinha certeza. Sabia das coisas. 

domingo, 3 de maio de 2015

#maispuraverdade


Amanda tinha facebook. Amanda gostava do facebook. Curtia páginas cool e estalkeava tranquilamente as pessoas. Um dia viu no feed de notícias que uma das páginas cool havia postado um vídeo mega interessante. O título era: vídeo mostra reação das pessoas ao presenciar um morador de rua sendo roubado.

Amanda não era uma pessoa má. Não era violenta. Não tinha nada contra gays, apesar de achar dois homens se beijando meio nojento. Não tinha nada contra negros, apesar de fechar os vidros do carro quando algum se aproximava. Tinha dó das crianças carentes, apesar de ignorá-las nos faróis e em todo o resto. Acreditava que os velhinhos mereciam respeito, apesar de nunca visitar a avó viúva e solitária. Não entendia porque gente gorda simplesmente não fechava a boca e emagrecia. Todos nós somos feitos de pequenas incoerências e hipocrisias. Amanda sabia. Tinha visto no facebook.