segunda-feira, 8 de novembro de 2021

O fenômeno Harry Potter



Harry Potter foi um fenômeno mundial, sua autora ficou bilionária e durante muito tempo parecia que todo mundo só falava sobre isso, uns bem, outros mal, mas não deixavam de falar. Eu tinha assistido aos filmes, mas não tinha muito interesse em fazer mais que isso.  Minha irmã, que é fã de carteirinha, ficava insistindo para eu ler e depois de algum tempo, acabei cedendo. Harry Potter então se tornou um dos meus livros favoritos, eu fiquei maravilhada com o universo fantástico criado pela JK Rowling.

Não é a toa que Harry Potter alcançou um sucesso sem precedentes: é uma série inteligente, com um universo próprio bem elaborado, mistérios, romance, personagens interessantes. Uma das coisas mais legais do livro é que as personagens cresceram com os leitores. O primeiro volume é mais inocente e bonitinho, mas conforme a história vai evoluindo tudo fica mais complexo e sombrio, sem perder o encanto do início. Muita gente cresceu com os três aprendizes de bruxo e por isso, sente um carinho especial pelas histórias.

Uma das maiores qualidades da série são suas personagens bem construídas, complexas e verdadeiras. É tão comum encontrar personagens que se reduzem a caricaturas: a garota inteligente, o menino nerd, o engraçado, o bully, etc, mas JK Rowling conseguiu elevar suas criações acima disso e criar personalidades, que apesar de facilmente identificáveis (por exemplo, Hermione é a garota inteligente e Draco é o bully) vão muito além do que se poderia chamar de suas características principais, muitas vezes são inconsistentes, (assim como as pessoas da vida real) não são meros estereótipos, mas sim personalidades completas, que surpreendem o leitor quando fogem do comportamento esperado. Um bom exemplo disso ocorre no sétimo livro quando Neville, percebido como covarde, tímido e passivo toma a frente da ação na escola e se torna um exemplo de rebeldia contra um sistema tirano. Outro exemplo são as inúmeras vezes em que Hermione, a garota certinha que quer fazer tudo de acordo com as regras, quebra essas mesmas regras para atingir seus objetivos.

Dumbledore, Draco Malfoy e Professor Snape também precisam ser lembrados. O primeiro, que durante quase toda a história possuía aquela aura quase mística de espírito superior, tem a reputação abalada pela publicação de sua biografia. O professor visto como sábio, bondoso e bem humorado aparece sob uma nova luz quando erros de seu passado são revelados. No sétimo livro as inseguranças e dúvidas de alguém que parecia saber de tudo são reveladas, mostrando um lado vulnerável e falho daquele que parecia ser perfeito.

Draco Malfoy se desenvolve muito e passa do antagonista de um livro infantil para um adolescente cheio de angústias, preso a uma realidade da qual não consegue escapar, mas a qual obviamente não quer pertencer. Draco passou a vida inteira ouvindo que era superior por ser um Sangue-Puro e parece ter herdado a arrogância dos pais, mas quando percebe as conseqüências que esse tipo de ideologia pode ter, começa a questionar esses valores. Apesar de não ser tratada abertamente, a transformação de Malfoy é indicada sutilmente através de várias atitudes tomadas pelo garoto, principalmente nos sexto e sétimo livros.

E por fim, Professor Snape, que poderia ter sido um simples vilão que engana a todos menos ao herói, mas que tem na verdade a história mais complexa e profunda da série. Quem reler os livros depois de desvendar todos os mistérios envolvendo o Professor mais temido pelos alunos de Hogwarts verá um novo significado em cada palavra e ato da personagem mais perturbada do universo de Harry Potter.

Apesar do cenário de fantasia, Harry Potter trata de assuntos muito próximos ao nosso dia-a-dia, o preconceito é um tema sempre presente: os Sangue Puro se sentem superiores aos sangue-ruim ou Muggleborns, a população bruxa em geral se sente superior aos Trouxas e às outras criaturas mágicas. Essas tensões podem ser facilmente transpostas para nossa sociedade, na qual encontramos diariamente exemplos de racismo, misoginismo, homofobia e xenofobia.

Os problemas de aceitação do diferente se intensificam quando Voldemort volta ao poder. A hierarquia entre as classes fica mais clara e a perseguição a tudo que não é o padrão estabelecido é descarada. Aliás, o papel da repressão e do medo na perpetuação desses preconceitos fica evidente: muita gente não concorda com o que está acontecendo, mas tem medo de se expor, então acaba escolhendo o silencio.

Voldemort instaura uma ditadura, pessoas são torturadas e desaparecem, jornais são censurados e instituições de ensino perdem sua autonomia. E esse ambiente de terror e opressão é criado quase que num piscar de olhos. Tudo isso ecoa a situação vivida em vários países da America Latina, Oriente Médio e outros no decorrer do século XX e também do XXI. Nessa série infanto-juvenil põem-se em discussão questões importantíssimas e muito reais: como é fácil passar de uma sociedade democrática para uma autoritária se não prestarmos constante atenção aos sinais. (Lembra que ninguém queria aceitar que Voldemort havia voltado, mesmo com todas as evidencias?) Se não nos mantivermos atentos ao mundo a nossa volta, isso pode mesmo acontecer. Vale lembrar que o jornal O Estadão foi censurado e está proibido de publicar notícias sobre a família Sarney. Isso na Republica Federativa do Brasil, um país democrático que supostamente respeita a liberdade de imprensa!!

A lição da série, porém, é de que precisamos nos mexer para que as coisas mudem, algumas pessoas se organizam e decidem lutar pelos seus ideais. E depois de muitas dificuldades e perdas (porque o combate à violência, à opressão e ao preconceito não é fácil) conseguem triunfar.

Sim, Harry Potter trata de questões muito sérias das quais não deveríamos nos esquecer nunca, mas também há um lado mais leve nesse universo. Boa parte dos livros é usada para descrever o dia-a-dia da vida na escola: a preocupação com as provas, as conversas entre amigos, a rivalidade entre as casas. O humor sutil presente em todos os sete volumes mesclado a temas e situações sérias torna a série muito mais interessante, divertida e acessível aos leitores.

Essa combinação muito bem feita de histórias de desenvolvimento pessoal intricadas com questões relevantes à vida em sociedade faz dessa série uma das melhores escritas nos últimos anos, que merece todo o sucesso que obteve e que mora no coração de milhões de pessoas espalhadas pelo planeta.

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