segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Jane the Virgin - uma hommage às telenovelas e ao realismo mágico

 


Jane the Virgin tem alguns defeitos, como qualquer série. Mas não quero falar deles porque o show é muito, mas muito bom.

O primeiro ponto positivo que eu destacaria é o tema central da narrativa: o relacionamento (e o amor) das mulheres Villanueva: Alba, a avó, Xiomara, a mãe e Jane, a filha. Em pleno 2021 é tão difícil encontrar séris e livros que tratam sobre mulheres que isso por si só já me atrai. E a construção desse relacionamento é magistral. Elas começam muito próximas, mas com várias questões não resolvidas que o show vai elaborando ao longo das temporadas. O arco de crescimento é muito bem feito. Acredito que a série seja sobre isso: relacionamentos entre mulheres. E aqui a gente pode colocar as personagens Lina e Petra. A última também tem um arco de crescimento fantástico.

Outra coisa que é muito legal é a homenagem às telenovelas. O fato de a série retratar mulheres latinas (muito pouco representadas) é maravilhoso. E as mulheres Villanueva são viciadas em novelas (latinoamericanas, claro). Nessa toada, também temos o pai de Jane, que é um famoso ator mexicano. Mas a homenagem não para por aí. As reviravoltas e acontecimentos absurdos são incluídos na série, fazendo dela uma paródia (é importante lembrar aqui que paródia não é tirar sarro, mas sim pegar um gênero e incorporá-lo em outro) perfeita do gênero. Quando a irmã gêmea perdida de Petra surge, foi impossível não lembrar de Paola e Paulina, a gêmea boa e a gêmea má, da novela A usurpadora, que foi um sucesso aqui no Brasil. O absurdo dos acontecimentos não caberia em uma série americana comum, mas o universo de Jane the Virgin permite que eles ocorram naturalmente.

O último ponto é o realismo mágico, uma das criações mais belas da literatuara, que surgiu na América Latina. Quando Jane (e outras personagens) sentem amor, o coração dela brilha. Quando recebe flores, elas desabrocham em suas mãos. Quando beija Michael, ela volta flutuando para casa. Quando beija Rafael, pétalas de flores começam a cair ao redor deles. Isso sem contar o fato de Jane conversar com as personagens de seus livros, que ganham vida e aparecem como pessoas de carne e osso em sua frente, ou o fato de estátuas e ursinhos de pelúcia falarem. Também há a briga no ringue entre Jane e Petra e a cena mediaval com Jane e Michael. O uso do mágico funciona, de novo, porque o universo da série permite que esses elementos sejam incorporados.

Jane the Virgen é um deleite. Recomendo muitíssimo.


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segunda-feira, 8 de novembro de 2021

O fenômeno Harry Potter



Harry Potter foi um fenômeno mundial, sua autora ficou bilionária e durante muito tempo parecia que todo mundo só falava sobre isso, uns bem, outros mal, mas não deixavam de falar. Eu tinha assistido aos filmes, mas não tinha muito interesse em fazer mais que isso.  Minha irmã, que é fã de carteirinha, ficava insistindo para eu ler e depois de algum tempo, acabei cedendo. Harry Potter então se tornou um dos meus livros favoritos, eu fiquei maravilhada com o universo fantástico criado pela JK Rowling.

Não é a toa que Harry Potter alcançou um sucesso sem precedentes: é uma série inteligente, com um universo próprio bem elaborado, mistérios, romance, personagens interessantes. Uma das coisas mais legais do livro é que as personagens cresceram com os leitores. O primeiro volume é mais inocente e bonitinho, mas conforme a história vai evoluindo tudo fica mais complexo e sombrio, sem perder o encanto do início. Muita gente cresceu com os três aprendizes de bruxo e por isso, sente um carinho especial pelas histórias.

Uma das maiores qualidades da série são suas personagens bem construídas, complexas e verdadeiras. É tão comum encontrar personagens que se reduzem a caricaturas: a garota inteligente, o menino nerd, o engraçado, o bully, etc, mas JK Rowling conseguiu elevar suas criações acima disso e criar personalidades, que apesar de facilmente identificáveis (por exemplo, Hermione é a garota inteligente e Draco é o bully) vão muito além do que se poderia chamar de suas características principais, muitas vezes são inconsistentes, (assim como as pessoas da vida real) não são meros estereótipos, mas sim personalidades completas, que surpreendem o leitor quando fogem do comportamento esperado. Um bom exemplo disso ocorre no sétimo livro quando Neville, percebido como covarde, tímido e passivo toma a frente da ação na escola e se torna um exemplo de rebeldia contra um sistema tirano. Outro exemplo são as inúmeras vezes em que Hermione, a garota certinha que quer fazer tudo de acordo com as regras, quebra essas mesmas regras para atingir seus objetivos.

Dumbledore, Draco Malfoy e Professor Snape também precisam ser lembrados. O primeiro, que durante quase toda a história possuía aquela aura quase mística de espírito superior, tem a reputação abalada pela publicação de sua biografia. O professor visto como sábio, bondoso e bem humorado aparece sob uma nova luz quando erros de seu passado são revelados. No sétimo livro as inseguranças e dúvidas de alguém que parecia saber de tudo são reveladas, mostrando um lado vulnerável e falho daquele que parecia ser perfeito.

Draco Malfoy se desenvolve muito e passa do antagonista de um livro infantil para um adolescente cheio de angústias, preso a uma realidade da qual não consegue escapar, mas a qual obviamente não quer pertencer. Draco passou a vida inteira ouvindo que era superior por ser um Sangue-Puro e parece ter herdado a arrogância dos pais, mas quando percebe as conseqüências que esse tipo de ideologia pode ter, começa a questionar esses valores. Apesar de não ser tratada abertamente, a transformação de Malfoy é indicada sutilmente através de várias atitudes tomadas pelo garoto, principalmente nos sexto e sétimo livros.

E por fim, Professor Snape, que poderia ter sido um simples vilão que engana a todos menos ao herói, mas que tem na verdade a história mais complexa e profunda da série. Quem reler os livros depois de desvendar todos os mistérios envolvendo o Professor mais temido pelos alunos de Hogwarts verá um novo significado em cada palavra e ato da personagem mais perturbada do universo de Harry Potter.

Apesar do cenário de fantasia, Harry Potter trata de assuntos muito próximos ao nosso dia-a-dia, o preconceito é um tema sempre presente: os Sangue Puro se sentem superiores aos sangue-ruim ou Muggleborns, a população bruxa em geral se sente superior aos Trouxas e às outras criaturas mágicas. Essas tensões podem ser facilmente transpostas para nossa sociedade, na qual encontramos diariamente exemplos de racismo, misoginismo, homofobia e xenofobia.

Os problemas de aceitação do diferente se intensificam quando Voldemort volta ao poder. A hierarquia entre as classes fica mais clara e a perseguição a tudo que não é o padrão estabelecido é descarada. Aliás, o papel da repressão e do medo na perpetuação desses preconceitos fica evidente: muita gente não concorda com o que está acontecendo, mas tem medo de se expor, então acaba escolhendo o silencio.

Voldemort instaura uma ditadura, pessoas são torturadas e desaparecem, jornais são censurados e instituições de ensino perdem sua autonomia. E esse ambiente de terror e opressão é criado quase que num piscar de olhos. Tudo isso ecoa a situação vivida em vários países da America Latina, Oriente Médio e outros no decorrer do século XX e também do XXI. Nessa série infanto-juvenil põem-se em discussão questões importantíssimas e muito reais: como é fácil passar de uma sociedade democrática para uma autoritária se não prestarmos constante atenção aos sinais. (Lembra que ninguém queria aceitar que Voldemort havia voltado, mesmo com todas as evidencias?) Se não nos mantivermos atentos ao mundo a nossa volta, isso pode mesmo acontecer. Vale lembrar que o jornal O Estadão foi censurado e está proibido de publicar notícias sobre a família Sarney. Isso na Republica Federativa do Brasil, um país democrático que supostamente respeita a liberdade de imprensa!!

A lição da série, porém, é de que precisamos nos mexer para que as coisas mudem, algumas pessoas se organizam e decidem lutar pelos seus ideais. E depois de muitas dificuldades e perdas (porque o combate à violência, à opressão e ao preconceito não é fácil) conseguem triunfar.

Sim, Harry Potter trata de questões muito sérias das quais não deveríamos nos esquecer nunca, mas também há um lado mais leve nesse universo. Boa parte dos livros é usada para descrever o dia-a-dia da vida na escola: a preocupação com as provas, as conversas entre amigos, a rivalidade entre as casas. O humor sutil presente em todos os sete volumes mesclado a temas e situações sérias torna a série muito mais interessante, divertida e acessível aos leitores.

Essa combinação muito bem feita de histórias de desenvolvimento pessoal intricadas com questões relevantes à vida em sociedade faz dessa série uma das melhores escritas nos últimos anos, que merece todo o sucesso que obteve e que mora no coração de milhões de pessoas espalhadas pelo planeta.

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segunda-feira, 1 de novembro de 2021

Me Gritaron Negra - Victoria Santa Cruz

Poema fenomenal!


Tenía siete años apenas,
apenas siete años,
¡Que siete años!
¡No llegaba a cinco siquiera!

De pronto unas voces en la calle
me gritaron ¡Negra!
¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! ¡Negra!

“¿Soy acaso negra?” – me dije ¡SÍ!
“¿Qué cosa es ser negra?” ¡Negra!
Y yo no sabía la triste verdad que aquello escondía. Negra!
Y me sentí negra, ¡Negra! 
Como ellos decían ¡Negra! 
Y retrocedí ¡Negra!
Como ellos querían ¡Negra!
Y odié mis cabellos y mis labios gruesos
y miré apenada mi carne tostada
Y retrocedí ¡Negra!
Y retrocedí…
¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! ¡Negra!
¡Negra! ¡Negra! ¡Neeegra!
¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! ¡Negra!
¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! ¡Negra!

Y pasaba el tiempo,
y siempre amargada
Seguía llevando a mi espalda
mi pesada carga

¡Y cómo pesaba! …
Me alacié el cabello,
me polveé la cara,
y entre mis cabellos siempre resonaba
la misma palabra
¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! ¡Negra!
¡Negra! ¡Negra! ¡Neeegra! 
Hasta que un día que retrocedía,
retrocedía y que iba a caer
¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! ¡Negra!
¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! ¡Negra!
¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! ¡Negra!
¡Negra! ¡Negra! ¡Negra! 
¿Y qué?

¿Y qué? ¡Negra! 
Sí ¡Negra! 
Soy ¡Negra!
Negra ¡Negra! 
Negra soy

¡Negra! Sí
¡Negra! Soy
¡Negra! Negra
¡Negra! Negra soy
De hoy en adelante no quiero
laciar mi cabello
No quiero
Y voy a reírme de aquellos,
que por evitar – según ellos –
que por evitarnos algún sinsabor
Llaman a los negros gente de color
¡Y de qué color! NEGRO
¡Y qué lindo suena! NEGRO 
¡Y qué ritmo tiene! 
NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO NEGRO 
Al fin
Al fin comprendí AL FIN 
Ya no retrocedo AL FIN 
Y avanzo segura AL FIN 
Avanzo y espero AL FIN
Y bendigo al cielo porque quiso Dios
que negro azabache fuese mi color
Y ya comprendí AL FIN 
Ya tengo la llave 
NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO NEGRO NEGRO
NEGRO NEGRO 
¡Negra soy!


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segunda-feira, 11 de outubro de 2021

Is everyone hanging out without me e a adorável Mindy Kaling


Eu já conhecia a Mindy Kaling por causa do The Office, série na qual ela interpretou a personagem Kelly Kapoor, além de escrever, produzir e dirigir vários episódios. Também já tinha ouvido dizer que sua personagem era meio que uma versão exagerada da atriz. Só pelo fato de ela ser uma das mentes brilhantes por trás desse programa, eu já simpatizava com Kaling, mas o que me fez decidir comprar Is Everyone Hanging Out Without Me? foi um trecho do livro que eu li em algum site, que discorria sobre a situação da comédia romântica na atualidade. 

Is Everyone Hanging Out Without Me? é uma leitura bastante fácil, seu tom casual dá a impressão de que a autora está simplesmente falando ao telefone com uma amiga. Não sou muito fã de biografias ou autobiografias, mas o livro de Mindy Kaling se aproxima mais de uma coletânea de colunas soltas de um jornal, revista ou mais acertadamente de um blog sobre cultura pop. A própria autora entende perfeitamente a vibe de seu livro diz: 

“Você só vai levar dois dias para ler esse livro. Você viu a capa? É praticamente toda rosa. Se você estiver lendo esse livro todas as noites, por meses, algo está errado.” 

Realmente “Is Everyone Hanging Out Without Me?” é uma leitura fácil, mas isso não é um demérito e Mindy Kaling atinge seus objetivos, eu acredito que o livro seja exatamente o que ela quis que ele fosse. Os temas abordados são bastante variados. Realmente variados. Vou citar os nomes de alguns capítulos: 

Etiqueta de Karaokê; 

Os direitos e responsabilidades de melhores amigas; 

Tipos de Mulheres em Comédias Românticas que não são reais; 

O dia que eu parei de comer cupcakes; 

Instruções precisas para o meu funeral. 

Apesar de cheio de partes sobre romance, comédias românticas e afins, Is Everyone Hanging Out Without Me? também é cheio de sororidade e feminismo. Um dos melhores momentos do livro é aquele em que Mindy fala sobre como Amy Poehler é incrivelmente incrível, coisa que eu já suspeitava. Mas falando sobre feminismo, há alguns trechos interessantes: 

Porque você não falou sobre se mulheres são engraçadas ou não? 

Eu só senti que comunicando isso de algum modo, seria uma aprovação tácita disso como um debate legítimo, o que não é. Seria o mesmo que falar sobre o assunto: “Gatos e cachorros deveriam poder cuidar de crianças? Eles já estão na casa mesmo.” Eu tento não discutir seriamente assuntos sem sentido.

O melhor de tudo são os insights sobre comédias românticas, que demonstram a percepção de como a indústria do cinema pode ser absurda em relação à representação feminina: 

A mãe de 42 anos do protagonista de 30: Eu estou tão acostumada ao fenômeno da mãe jovem, que quando eu vi o pôster de A Proposta, eu imaginei por um segundo se a proposta do filme seria Ryan Reynolds sugerindo mandar sua mãe, Sandra Bullock, para um asilo." 

Eu simplesmente considero comédias românticas um subgênero de ficção cientifica, na qual o mundo criado tem regras diferentes das do meu mundo humano normal.

Pra mim, esse é a perfeita definição do que sejam comédias românticas! Mindy Kaling é genial! O estilo e a personalidade da autora são facilmente reconhecíveis em Is Everyone Hanging Out Without Me? e isso faz com que seu livro seja muito acessível. Acho que já dei muitos spoilers, mas só para terminar vou dizer que é impossível não gostar de um livro escrito por uma mulher inteligente e engraçadíssima, cheio de menções à cultura pop, Jane Austen e Colin Firth. É uma ótima leitura para qualquer um que goste de rir!

segunda-feira, 2 de agosto de 2021

E Luana estava aqui

 Luana achava que era Jesus Cristo. Não, não era como aquele cara estranho que faz versões das músicas da Amy e da Britney. Não era como ele. Era como se tivesse nascido com vocação pra Madre Teresa de Calcutá. Só que não tinha.


Luana nasceu na miséria e cresceu na miséria. Assim, sempre buscou a miséria. Nesse mundo, encontrou-a em abundancia. E continuou acreditando apenas nela.