Bauman inicia a
obra Tempos líquidos (2007), Bauman (2007, p. 7) dizendo que “passamos
da fase “sólida” da modernidade para a “líquida””. Para o autor, isso significa
que antes possuíamos estruturas que limitavam as escolhas individuais e
instituições que asseguravam a repetição de rotinas, mas que elas não podem
mais manter sua forma por muito tempo, pois se dissolvem muito rapidamente.
Ele também fala
sobre a perda de poder do Estado moderno para um mundo globalizado. Isso
aconteceria porque aquele é local e este é planetário. Diz ainda que as funções
dos Estados passam agora para o mercado, que controla a vida dos indivíduos e,
notadamente, expõe as pessoas aos seus caprichos, promove a competitividade e
diminui a colaboração.
Bauman cunha o
termo “globalização negativa” e diz (BAUMAN, 2007, p. 13):
(...) uma globalização seletiva do
comércio e do capital, da vigilância e da informação, da violência e das armas,
do crime e do terrorismo; todo unânimes em seu desdém pelo princípio da
soberania territorial e em sua falta de respeito a qualquer fronteira entre
Estados. Uma sociedade “aberta” é uma sociedade exposta aos golpes do
“destino”.
Ele também enfatiza
a função do medo nessa nova sociedade, que se espalharia quase que
organicamente e sem freios. Isso aconteceria porque a vida humana se tornou
instável: empregos, parceiros, redes de amizades. Para ele, a ideia de
progresso, em vez de ser positiva, causa o medo de ser deixado para trás, o
que, por sua vez, causa uma angústia existencial. Esse medo não vem à toa. Ele
é muito lucrativo, tanto comercial, quanto politicamente. Bauman afirma que a
ideia de segurança pessoal se tornou a bandeira da política. O medo vem também
do “desmantelamento das defesas construídas e mantidas pelo Estado contra os
temores existenciais.” (2007, p. 20). Para ele, vivemos um “cada um por si e
Deus por todos”. Bauman ainda explica que o enfoque no medo individual vem
associado à precarização do chamado Estado de bem-estar social. Para se
aprofundar na questão do medo, ele cita a chamada “guerra ao terror”, que, como
exemplifica, em vez de gerar mais segurança, fez aumentar o número de armas
leves presentes na sociedade. Tudo isso causa uma falta de solidariedade
coletiva e aumenta o individualismo. Bauman afirma (2007, p. 21):
O medo é reconhecidamente o mais
sinistro dos demônios que se aninham nas sociedades abertas de nossa época. Mas
é a insegurança do presente e a incerteza do futuro que produzem e alimentam o
medo mais apavorante e menos tolerável. Essa insegura e essa incerteza, por sua
vez, nascem de um sentimento de impotência: seja individual, separada ou
coletivamente (...)
Depois
disso, Bauman passa a falar sobre a questão dos refugiados no mundo
capitalista. O autor afirma que um de seus resultados mais fatais é o “lixo humano”,
“milhões de homens e mulheres privados de suas terras, locais de trabalho e
redes comunais de proteção.”. (2007, p. 34). Ele diz ainda que o capitalismo
não consegue reassimilar ou eliminar esse lixo humano. Para Bauman a situação
fica mais complicada quando o “lixo” está ao lado dos “normais”. Isso porque aqueles lembram a estes que podem
facilmente, um dia, estar nessa posição. Ao falar sobre as guerras, que
estariam desregulamentadas como efeito da globalização, o autor (2007, p. 43)
afirma sobre os fugitivos:
(...) são, além de tudo, privados do
apoio de uma autoridade de Estado reconhecida que possa colocá-los sob sua
proteção, fazer valer seus direitos e interceder em seu favor junto a potências
estrangeiras. Os refugiados são pessoas sem Estado (...)
Para Bauman, depois
que uma pessoa se torna refugiada, ela o será para sempre. Ele (2007, p. 45)
cita como exemplo:
Há, por exemplo, cerca de 900 mil
refugiados dos massacres intertribais e dos campos de batalha das guerras
selvagens travadas há décadas na Etiópia e na Eritreia, espalhados pela região
Norte do Sudão (incluindo a mal-afamada Darfur), por si mesmo uma nação
empobrecida e devastada pela guerra, além de apinhada de outros refugiados que
relembram com horror os campos de extermínio do sul do país.
Também
exemplifica que, no campo de Kassala, a água foi cortada e os habitantes
removidos à força, como ocorreu quando se tornaram refugiados, o que
impossibilita qualquer possibilidade de retorno. Bauman também argumenta que as
agências humanitárias acabam por desempenhar o papel de “faxineiros étnicos” e
de agentes de exclusão, pois mantêm os refugiados “protegidos”, acalmando o
público expectador. Mas a realidade é que os refugiados são “lixo humano”, não
têm chances de integração no corpo social. Prova disso é que:
Os estadistas da “União Europeia”
empregam a maior parte do seu tempo e inteligência planejando formas cada vez
mais sofisticadas de fortificar as fronteiras e procedimentos mais eficazes
para se livrarem das pessoas que, apesar de tudo, conseguiram atravessá-las e
estão em busca de pão e abrigo. (BAUMAN, 2007, p. 48)
Para Bauman, os refugiados perdem seu lugar, pois são expulsos de seus locais de origem, mas têm sua entrada em qualquer outro proibida. O autor ainda reflete que esse é um problema da impossibilidade de resolver localmente uma questão que é global. Mas os países do Norte global procuram se proteger com alternativas internas, como fortificações, cercas e câmeras de circuito fechado. Só que isso não é eficiente, pois a questão da inclusão e da exclusão já estão presentes em todo o globo, com “lixo humano” sendo produzido por toda parte.
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